Ao final do dia, minha mãe quase sempre cochilava no sofá, de tão cansada. Ela só acordava depois da meia-noite, quando eu a chamava para me colocar na cama. E antes de dormir, ela me dizia: “Nossa! Preciso tomar banho, pois não deu tempo hoje.” Eu sabia o motivo.
Muitas mães assumem sozinhas as tarefas diárias relativas aos filhos com deficiência, enfrentando uma sobrecarga física e emocional. Uma violência oculta imposta pelo machismo estrutural, que exime muitos pais desta responsabilidade. A luta por igualdade passa necessariamente pelo reconhecimento de que o cuidado deve ser uma tarefa compartilhada.
O machismo é uma força invisível que influencia as dinâmicas familiares. Quando analisamos sua relação com os cuidados de crianças com deficiência, vemos como ele sobrecarrega as mulheres. Uma realidade de violência oculta, que piora quando há isolamento, falta de suporte, preconceitos sociais e dificuldades financeiras.
O sentimento de abandono – por parte do parceiro, da sociedade e do poder público – gera altos índices de ansiedade, depressão e exaustão. Na relação, é preciso equilibrar as demandas do cuidado, que, em muitos casos, se somam a outros encargos assumidos pela mulher, como trabalho e organização da casa.
Estudos mostram que uma parcela significativa de homens abandona a família após receber o diagnóstico da deficiência da criança, desencadeando crises que expõe fragilidades nos papeis de gênero. Reflexo de um sistema que condiciona os homens a não se envolverem nos cuidados e a não enfrentarem desafios que exigem tanta dedicação.
Como resultado, as mães se tornam as principais ou até as únicas cuidadoras. Mesmo convivendo com seus companheiros, muitas delas assumem sozinhas as tarefas diárias, que incluem rotinas de higiene, alimentação, terapias e consultas médicas constantes, além de atenção redobrada e outras necessidades específicas. Essa situação origina-se da crença machista de que cuidar é uma função feminina, desresponsabilizando, portanto, os homens.
E quem cuida de quem cuida? As cuidadoras familiares (mães, avós, tias, irmãs ou esposas) enfrentam silenciosamente jornadas exaustivas, priorizando o outro e deixando elas próprias em último plano. Suas dores e necessidades muitas vezes são esquecidas. Sem uma rede de apoio, seguem em um caminho de solidão e desgaste, sem perspectiva de ajuda. É urgente serem vistas, ouvidas, protegidas e apoiadas.
Em casos de separação do casal, o compromisso de ambos não pode ser dissolvido. Criar e cuidar dos filhos, inclusive quando há uma situação de deficiência, deve ser uma obrigação permanente dos dois, que não pode ficar comprometida quando a relação amorosa termina. Pais e mães presentes e participativos nos cuidados demonstram que o amor transcende qualquer mudança em seus status de relacionamento. Esse ato contínuo também fortalece emocionalmente a criança e cria um exemplo de vínculo e parceria, essencial para lidar com os desafios.
A paternidade não pode ser menos responsável do que a maternidade. Porém, há exceções, pois sabemos da existência de pais que exercem o verbo paternar em sua plenitude, inclusive nos cuidados do filho com deficiência.
A solução para esse problema exige uma mudança cultural ampla e profunda. Homens precisam ser educados desde cedo a enxergar o cuidado como uma responsabilidade coletiva, não como uma atribuição exclusiva das mulheres. É essencial criar redes de apoio, como suporte emocional, financeiro e prático. Políticas públicas têm um papel super relevante neste processo, seja por meio de licenças parentais mais equitativas, que incentivem a participação masculina, seja pela oferta de serviços que reduzam a carga sobre elas. As empresas privadas também podem contribuir nesta ação, conhecendo seus colaboradores e oferecendo o devido amparo.
Ao questionarmos o machismo neste contexto, não estamos apenas buscando justiça para essas mulheres, mas também construindo uma sociedade mais igualitária, onde o cuidado é reconhecido como um valor compartilhado, fundamental para o bem-estar de todos os seus membros.
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