UM TRATAMENTO À BASE DE ESPERANÇA

 

No dia 22 de março de 2019 iniciei mais uma etapa da minha jornada terrestre! Foi outro episódio inesquecível que compõem a história da minha vida e que relatarei a seguir, com leveza, humor e ironia. Quem me conhece ou me acompanha pelas redes sociais sabe que este é meu estilo de linguagem, mesmo quando o assunto é sério e preocupante!

Prepare-se para fortes emoções…

Essa viagem começou em outubro de 2018, e confesso que estava pessimista em relação ao seu sucesso.

Foi protocolado, no fórum de Amparo/SP, um processo solicitando a concessão de um tratamento de saúde que consiste em diversas aplicações, na medula espinhal, de um medicamento importado e de altíssimo custo chamado Nusinersen (conhecido como Spinraza), o único no mundo indicado para interromper o avanço da Atrofia Muscular Espinhal (AME) e proporcionar uma melhor qualidade de vida às pessoas acometidas por esta doença, que é considerada rara.

A ação judicial foi estruturada com a imprescindível ajuda da ONG “Brasil + Saúde” (http://brasilmaissaude.org.br/), baseada em Piracicaba/SP e atuante em todo o território nacional.

YEEEAAAHHH! Passados 5 meses da entrada na justiça, recebi a primeira dose do precioso líquido, no dia 22 de março de 2019, uma sexta-feira ensolarada.

Na verdade, eu não esperava grandes ganhos, como voltar a pintar e escrever manualmente, ou escovar os dentes e comer sem ajuda (que saudade de um bacon crocante!), mas confesso que tenho sim expectativas de uma melhora nas funções básicas e fundamentais, bastante comprometidas atualmente, como respirar, engolir, mastigar, sustentar o pescoço e a cabeça etc… Porém, se o único resultado obtido for estabilizar a progressão da doença, já será uma grande conquista, jamais imaginada um dia!

Resumo desse dia muito muito muito especial:

Saímos de casa por volta das 7:30 em um veículo adaptado da prefeitura, rumo a São Paulo, mais precisamente à Vila Mariana.

Depois de uma rápida preparação feita no setor de hemodinâmica do hospital e de conversas descontraídas com a médica e os enfermeiros (minha estratégia para amenizar a ansiedade e o nervosismo é falar, falar e falar muito), entrei em uma sala cirúrgica às 13:00. Após inúmeras tentativas frustrantes, voltei para o “ambulatório” – acho que o local pode ser definido assim -, visando descansar e receber um soro para reidratação. Nesse momento, começou outra “luta” envolvendo a enfermagem, dessa vez para encontrar uma veia. Depois de quase uma hora de busca, instalaram o acesso no meu dedo polegar da mão direita. Aaaaaaaiiiiiiiii!! Finalmente o soro glico-fisiológico começou a entrar, lentamente. A desidratação foi provocada provavelmente por causa do jejum de 10 horas e também porque não tenho o hábito de beber muita água diariamente. Outro complicador, já esperado, é minha super hiper mega escoliose, motivo da rigidez de minha coluna vertebral.

Após quase duas horas de descanso e reidratação, retornei para o campo principal de batalha devidamente “molhadinho” por dentro, com a energia e a fé renovadas, para novas investidas.

Sobre o procedimento:

Anestesiado apenas no local e, portanto, plenamente consciente, me posicionaram de ladinho, na posição fetal e quase fatal. Para “alegria” de toda equipe envolvida, eu não parava de falar e de cantar. O repertório escolhido ficou restrito a duas músicas. Enquanto a médica me perfurava com determinação, eu, resiliente, cantarolava o hino imortal “Que país é esse?!”, em alusão à dificuldade em adquirir o referido medicamento, devido seu preço inacreditável e surreal. Depois, cantei diversas vezes o refrão pegajoso da canção “Games People Play”, da banda Jamaicana de reggae, Inner Circle (Na-na-na, Na-na-na, Na-na. Na-na-na, Na-na-na, Na-na… Lembra?).

Resumidamente, a punção foi dolorosa, desconfortável e muito demorada, totalizando aproximadamente 3 horas (dividido em duas sessões de “tortura”) + 3 horas de observação, após finalmente terem conseguido. A punção foi guiada por imagem, através de um aparelho de radioscopia. Enfim, o dia foi tenso e cansativo, mas deu tudo certo! Retornamos para casa perto da meia-noite, felizes e esperançosos, eu, minha adorável esposa – que me acompanhou o tempo todo – e o dedicado e compreensivo motorista.

Em relação ao número de tentativas, eu parei de contar na quinta picada. Só a noite, já em casa, Elis contou 14 perfurações na região lombar da coluna, entre uma das vértebras.

Não tive nenhuma reação e, também por isso, hoje, eu só tenho motivos para agradecer, independentemente do que possa ocorrer nos próximos capítulos. Obrigado aos amigos e família pelo apoio e torcida, obrigado a todos os profissionais envolvidos, obrigado meritíssimo juiz, obrigado Deus, Jesus, Javé, Emanuel, Jeová, Alá, Maomé, Zeus, Moisés, Buda, Iemanjá, Oxum, Iansã, Ogum, Xangô, Thor, Poseidon, Apolo, Afrodite, Hércules, Amom, Shiva, Ganesha, Krishna, Brahma, Antarctica, Skol, Heineken e tantas outras divindades do Universo, por vivenciar esta oportunidade MARAVIWONDERFUL!!

Brincadeiras à parte, a gratidão é eterna e autêntica!

O troféu destaque – ou momento marcante – desses últimos dias vai para…………………….. minha filha.

Algumas semanas antes, depois de ter escutado atentamente nossa conversa a respeito de tudo isso, com os olhinhos arregalados, Lavínia me perguntou:

– DEPOIS DESSA INJEÇÃO VOCÊ VAI ANDAR, PAI??

Respondi sorrindo e camuflando a emoção:

– Não filha! Mas esse remédio vai fazer um bem danado para o papai.

Ela também sorriu e ficou em silêncio, provavelmente processando a informação.

Agora vem a parte escatológica do relato: Pior (ou quase pior) do que a dor e o desconforto vivenciados durante o processo, foi ter que segurar a vontade de soltar um pum! É isso mesmo que você leu. O acúmulo inconveniente de gases intestinais ocorreu no momento mais inapropriado do dia, chegando a provocar cólicas! O desejo de cometer o ato da flatulência em direção à face da Doutora só aumentava. Eu só consegui me aliviar no intervalo, enquanto tomava soro em outro ambiente um pouco mais privativo.

Hoje, depois de receber as quatro doses iniciais e aguardando o retorno ao médico para uma nova avaliação, percebo que o cansaço diminuiu durante as refeições e também enquanto eu falo, ou seja, tá mais fácil pra respirar. Infelizmente, ainda não sinto ganhos relacionados à força física.

Cada procedimento realizado no Hospital SEPACO (nos dias: 22/03, 05/04, 18/04 e 17/05) foi intenso, cheio de desafios e marcados pelas dores e desconfortos. Mas, assim como as rosas – que não devem ser lembradas somente pelos seus espinhos – essas experiências ficarão gravadas em minha memória também pelos momentos de acolhimento, cuidado, carinho e descontração, proporcionados pela competente equipe médica e de enfermagem responsáveis pelas aplicações.

Finalizando, quero dirigir-me, direta ou indiretamente, às pessoas e familiares que vivenciam uma situação similar, seja aguardando uma decisão judicial ou arrecadando um montante suficiente para cobrir os gastos exorbitantes deste tratamento, por meio de vaquinhas virtuais, rifas, bingos ou outras ações beneficentes:

“Acreditem e não desistam! A vida é maravilhosa e não podemos ter medo dela! Se agarrem à todas as oportunidades e tentativas que surgirem, e não meçam esforços para prosseguirem e superarem os obstáculos que certamente virão! Medo e desânimo fazem parte da caminhada, mas não podem ser fatores de desistência!”

 

PS: Faltou uma informação que vale a pena mencionar. Segundo estudos e registros, eu sou a única pessoa do Brasil acima de 50 anos que está utilizando o Spinraza. Minha classificação neste ranking nacional também me coloca entre os mais “velhos” do mundo.

Legal, né!?!

 

Pai de Rodinhas

A vida é da cor que a gente a pinta.

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